Eu “só” como peixe

Não existe diferença de sofrimento entre aquele que morre saído da água e aquele que morre quando sai do ovo. TODOS os animais se debatem quando estão a ser torturados, quando estão suspensos numa rede dum barco ou num gancho num matadouro. Quer se ouça um grunhido estridente saído duma festa onde todos riem e festejam, quer se ouça um cacarejo desesperado num quintal, quer se ouça um uivo duma jaula no canto de um jardim, quer se veja apenas uma boca que abre e fecha à procura de oxigénio, TODOS SÃO GRITOS!

Viver na água não faz do peixe menos animal, não faz do peixe menos capaz de sentir dor, prazer e vontade de viver. Peixe é animal, tal como o cão ou a girafa. Peixe também é carne, feito de carne. Podemos discutir sobre a rapidez da morte de cada animal, sobre a duração da sua vida, sobre o grau de respeito que teve antes de morrer, mas uma coisa é certa: todos os animais preferiam ser respeitados e livres. Nenhum animal gosta de ceder o seu corpo à panela, à ciência, às bandarilhas, ao anzol, às redes, às correntes ou às jaulas. Nenhum! Aliás, ele não cede o seu corpo para nada… roubam-lho!

Na culinária habituámo-nos a usar os termos “carne” e “peixe”, para distinguir animais de terra e animais de água. Quando queremos falar do impacto do consumo de animais na nossa saúde, usamos os termos “carnes brancas” e “carnes vermelhas”, consoante o grau de gordura que possuem. Mas estes, apesar de serem termos banalizados, não distinguem nem descrevem o grau de sofrimento duns e doutros, não existe um grupo superior ou um grupo cujo sacrifício seja mais permissível. Dizemos com orgulho “só como peixe” ou “só como carne branca”, quando, eticamente falando, essa distinção não existe. Animais são animais, reduzir e extinguir o seu consumo, sim, mas trocar uns pelos outros, o que faz por aqueles que viram a sua procura aumentada? Deixam-se umas espécies em paz, mas aumenta-se o sacrifício doutras?

E mais, quando alguém diz “eu só como peixe” temos de ter alguma consciência quanto ao “só”. Quando alguém diz “só como carne branca” isso não descreve apenas um bicho chamado “carne branca”, isso inclui galinhas, perus, patos, gansos, codornizes e todos os peixes/moluscos/crustáceos que existem no mar e no rio (e a pessoa escolhe entre aqueles que acha mais razoáveis/apetecíveis). Não existe um bicho na Terra chamado “peixe”. O “só” inclui: bacalhaus, sardinhas, robalos, atuns, raias, espadartes, salmões, cavalas, carapaus, fanecas, linguados, pescadas, e, normalmente, incluímos também todos os frutos do mar (que, reparem bem, NÃO são frutos!): lulas, polvos, gambas, lagostins, lagostas, camarões, mexilhões, caranguejos, ostras, percebes, lapas, chocos, santolas, etc.

Este artigo não é para atacar, rebaixar ou desvalorizar os passos que cada um dá. Eu sei que pode ser difícil deixar de comer animais e derivados, eu sei que nem toda a gente está preparada para enfrentar familiares e amigos, eu sei que todos temos dilemas, traumas, hábitos e caminhos muito próprios e que o que para uns é urgente e inquestionável, para outros é secundário e incerto. Mas embora procuremos formas de falar que suavizem/camuflem aquilo que fazemos ou não fazemos, a realidade continua a acontecer, nos matadouros, nos aviários, nos mares, nos rios, nos bosques, nas arenas, nos circos, nos laboratórios, nos jardins, nos quintais, nas cozinhas de todas as aldeias, vilas e cidades do Mundo. Usamos, inconscientemente, formas de falar que nos protegem emocionalmente, que nos ajudam a enfrentar os dias sem sermos esmagados pela culpa, mas a realidade continua a ocorrer. Fugimos dessa culpa com estratégias de linguagem, com desculpas sobre os leões, as ilhas desertas e a proteína, mas os animais não podem fugir de forma alguma. Está a acontecer com eles, com o corpo deles, na vida deles, agora, neste preciso momento e em cada um dos segundos que se seguem deste dia, todos os dias…

Deixo-vos um artigo que li hoje, sobre um pescador que deixou de pescar. Vale mesmo a pena ler e sentir.

http://www.veggietal.com.br/pescador-abandona-pesca/

 

2 comments

  1. Parabéns Bárbara por todo o teu percurso…para mudar o mundo, primeiro mudámo-nos a nós. O exemplo é o melhor ensinamento. bjinho e continua nesse caminho tão bonito e cheio de amor.

    Gostar

Grata pelo feedback